Relatório do BID mostra que a produtividade do investimento em infraestrutura pode aumentar mais de 40% na América Latina
Poucas políticas públicas no Brasil geram maior consenso entre os cidadãos, empresários e políticos que a necessidade de investir mais em infraestrutura para melhorar o transporte, a provisão de energia e a qualidade e o tratamento da água e saneamento. Esse consenso se explica em boa medida porque é evidente que o Brasil precisa investir mais em infraestrutura: enquanto a China investe 500 bilhões de dólares ao ano e a Índia 130 bilhões, o Brasil investiu 55 bilhões ao ano nesta década.
Entre 1970 e 1990, o Brasil destinou 5% do PIB para aumentar a infraestrutura, mas a partir de 1990 o investimento foi reduzido à metade. A redução tão forte no investimento em infraestrutura tem sido uma realidade compartilhada pelo México e Argentina, que junto com o Brasil são as maiores economias da América Latina.
O baixo investimento em infraestrutura no Brasil e no resto da região acontece porque os governos priorizaram o gasto corrente, deixando de lado o gasto de capital. O gasto público na América Latina aumentou 3,7% do PIB entre 2007 e 2014, destinando-se 90% deste aumento ao gasto corrente e apenas 10% para o investimento em infraestrutura. No Brasil, a menor prioridade dada ao investimento em infraestrutura é muito clara. O gasto de capital correspondia a 29,5% do gasto primário em 1993, caindo fortemente para 5,7% em 2015. Claramente o investimento em infraestrutura deixou de ser prioritário comparado com gastos correntes, como os salários e as aposentadorias.
Bem além das vontades políticas e das ações concretas adotadas nos últimos anos no Brasil para aumentar o investimento em infraestrutura, existem grande oportunidades para gerar mais e melhor infraestrutura com a mesma quantidade de recursos destinados ao investimentos. A chave é aumentar a eficiência do investimento.
O relatório do BID Melhores Gastos para Melhores Vidas mostra que a produtividade do investimento em infraestrutura pode aumentar mais de 40% na América Latina. Existem amplas oportunidades para melhorar todo o ciclo de geração de infraestrutura, desde seu planejamento, construção e supervisão. O desafio é duplo: escolher o melhor projeto e executá-lo bem.
Começando pelo planejamento é fundamental ter uma visão de país que gere consensos sobre os projetos mais importantes para fomentar a competitividade e a qualidade de vida. No caso do Brasil, isso envolve decisões de prioridade tais como desenvolver ferrovias ou continuar melhorando as rodovias para transportar cargas agrícolas, ou, diversificar a matriz energética do país impulsionando mais a geração de eletricidade a partir de fontes renováveis (eólica ou solar), comparada a alternativas como a geração térmica.
Sempre é importante considerar que a infraestrutura, uma vez construída, oferece serviços por muitas décadas e por isso os erros no tipo de projeto e sua localização são pagos por várias gerações.
Uma vez selecionados os projetos, é fundamental investir recursos suficientes para prepará-los adequadamente. Ter um amplo conjunto de projetos bem preparados, no qual fique claro como os custos serão cobertos é fundamental para atrair o setor privado para que opere e financie a infraestrutura. Nesta dimensão, o Brasil é o país que tem atraído o maior financiamento privado de infraestrutura na América Latina.
As etapas de contratação e construção da infraestrutura são a fonte dos maiores ganhos de produtividade. Como diz o ditado, “o diabo mora nos detalhes”. Quando os documentos de licitação não são bem preparados, e a supervisão da construção é insuficiente, os sobrecustos e atrasos acontecem. O relatório do BID mostra que essas ineficiências aumentam em 50% o custo dos projetos de infraestrutura na região, enquanto a média mundial é de 30%. Os atrasos podem chegar a representar 20% do custo total dos projetos. No Brasil, um indicador resume claramente a ineficiência do gasto – apenas 50% do orçamento aprovado para investimento em capital é executado, por isso é fundamental criar as condições para que se use os recursos disponíveis de maneira mais eficiente.
Outra fonte muito importante de ineficiência no gasto é a má alocação entre investimento novo e manutenção. O incentivo de todos os governos é inaugurar obra nova, e bem menos investir em manutenção. A manutenção não tem visibilidade, como por exemplo o investimento para evitar vazamentos em tubulações subterrâneas de água.
Muitas vezes o investimento em manutenção é o melhor uso que se pode dar aos recursos de investimento porque melhora o serviço e é muito mais econômico que fazer uma obra nova. O Brasil possui uma dívida pendente em manutenção. Exemplo disso é que 20% da rede viária pavimentada do Brasil está em más condições, contra 5% no Chile, as interrupções nos serviços de energia alcançam 17 horas no Brasil ao ano, seis horas a mais que no Equador e as perdas nos sistemas de distribuição de água alcançam 38% enquanto no Chile são de 30%. Claramente o Brasil precisa investir mais em manutenção.
Investir mais em infraestrutura é uma necessidade imperiosa no Brasil, mas em um contexto fiscal que não permite vislumbrar um boom de investimentos, o caminho mais concreto e factível para gerar mais infraestrutura e oferecer melhores serviços é aumentar a eficiência do gasto. Esta é uma tarefa complexa que requer fortalecer as instituições de planejamento, melhorar as condições para aumentar a transparência e competição no mercado da construção, e fortalecer a regulação técnica e econômica.
O esforço necessário para executar esta tarefa é consideravelmente pequeno quando comparado ao enorme potencial de ganhos sociais gerados a partir do melhor uso dos recursos. Especialmente quando não é possível fazer mais, fazer melhor é imprescindível.
Fonte: El País